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Renata Sorrah: "Mente quem diz que não gosta de aplauso"

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Renata Sorrah (Foto: Zô Guimarães/Ed. Globo)

 

Renata Sorrah fala rápido, gesticulando e sorrindo muito. O cabelo liso teima em escorregar por cima dos olhos, de um jeito que é quase marca registrada da atriz, sempre lembrada pelo público como a alcoólatra Heleninha Roitman, de Vale Tudo (1988), e a vilã Nazaré Tedesco, de Senhora do Destino (2004). As duas fazem parte de tipos inesquecíveis em uma carreira cuja vocação foi descoberta quase por acaso, durante um intercâmbio nos Estados Unidos, na década de 60, e que teve o total apoio dos pais, o empresário alemão Peter e a diplomata brasileira Miriam. “Eles só queriam saber se eu tinha talento”, diverte-se Renata, que, aos 66 anos, vive Leocádia, em Saramandaia, novela das 11 da TV Globo.

A personagem é a mãe dedicada de Lua Viana (Fernando Belo) e de João Gibão (Sérgio Guizé), este um rapaz que nasceu com asas. Em comum com ela, Renata tem o amor materno incondicional. “Não posso imaginar minha vida sem a Mariana”, diz a atriz sobre a única filha, médica de 31 anos, da união com o diretor Marcos Paulo, que morreu em 2011. Avó coruja de dois netos, Miguel, de 3, e Betina, de 1, Renata, que está solteira depois de quatro casamentos, mora no Rio de Janeiro. Nas ruas é frequentemente reconhecida pelos fãs, e gosta. “Mente quem diz que não gosta do aplauso.”

QUEM: O que você tem em comum com Leocádia?
RENATA SORRAH: O amor incondicional. Isso toda mãe tem. Ela é mãe de todos os filhos que têm algum problema, que não são iguais a todos os outros. Eu me segurei muito nisso. O filho tem asas, mas tudo bem...

QUEM: Em Saramandaia, você contracena com atores bem jovens. Que conselho daria a eles?
RS: Nenhum! Eu, dar conselho? Não sei dar conselho (risos)!

QUEM: Já recebeu algum conselho que ficou guardado para sempre?
RS: Eu era adolescente e tinha 15 anos, devia estar arrasada com alguma crise de amor. Disse: “Pai, por que você não me falou que a vida era assim? É só isso?”. E, aí, ele retrucou: “É, não te falei. A resposta para as suas inquietações é trabalho, trabalho, trabalho”. Foi um conselho maravilhoso.

QUEM: Como descobriu a vocação artística?
RS: Fui fazer o último ano da escola em um intercâmbio nos Estados Unidos e tinha aulas de teatro. Meu professor, um dia, quis saber o que eu ia fazer no Brasil, e disse: “Acho que você devia ser atriz”. Quando voltei, namorei o Aécio Andrade, fotógrafo que era irmão do Roberto Bonfim. Ele me avisou que estava abrindo um curso de teatro dirigido pelo Amir Haddad. Entrei e nunca mais saí. Sabe quando você descobre?

QUEM: Você viveu na Califórnia na explosão da contracultura, nos anos 60. Como foi a experiência?
RS: Morei em um lugar perto de Berkeley (berço do movimento hippie). A casa em que eu fiquei era meio caretinha, mas foi toda uma mudança para minha cabeça o que estava acontecendo lá, e, quando voltei, o que estava acontecendo aqui. Estava começando a me reconhecer e saber quem eu era.

QUEM: Seus pais apoiaram a sua escolha de carreira?
RS: Sim. Minha mãe era diplomata, meu pai, alemão. Ele já vivia aqui, e a história deles é linda. A família do meu pai era judia, era a época da guerra, e minha mãe ajudou meus avós e minha bisavó a vir para cá. Meu pai tem 99 anos e trabalha todo dia, tem uma cabeça incrível. Meus pais eram muito abertos e bacanas. Eles só queriam saber se eu tinha talento. Eu já fazendo A Gaivota, de Tchekhov, no Theatro Municipal, e meu pai foi perguntar para o (diretor) Ziembinski: “Você acha que ela tem talento?”. E eu: “Pai, para que perguntar isso?” (risos).

QUEM: Você começou no teatro em plena ditadura. A pressão era, de certa forma, um estímulo a mais?
RS: Acho que sim. A gente queria fazer uma peça e os censores iam, sentavam, olhavam, diziam o que podíamos fazer ou não e ainda pediam para falar com o autor, com Sófocles (dramaturgo grego que viveu no século 4 antes de Cristo). Quando estreei, a polícia fechou o teatro, a gente tinha no camarim pedaços de pau, caso invadissem. Bateram na Marília Pêra na rua. Foi uma época conturbada, mas isso, ao mesmo tempo, te dá uma força. Na época, meu pai perguntava se eu não queria estudar fora, e eu dizia que não. Era aqui que eu tinha que ficar e trabalhar.

Renata Sorrah (Foto: Zô Guimarães/Ed. Globo)

 

QUEM: Você fez mais de 20 novelas. Heleninha Roitman, de Vale Tudo, ainda é sua personagem mais conhecida?
RS:
A Nazaré, de Senhora do Destino, também é muito popular, mas falam mesmo da Heleninha até hoje. Ela ficou. Tem grupo no Orkut, no Facebook, são as Heleninhas.

QUEM: Suas personagens são, em geral, emotivas. Você é assim em sua vida pessoal?
RS:
Sou. Eu quero ser low profile, mas não consigo. Engraçado que eu não sou uma pessoa triste, sou alegre, solar, mas meu olhar é triste. Logo que comecei a fazer televisão, eram cartas e mais cartas falando do meu olhar triste. Eu não tinha tempo para responder, e minha mãe adorava, ela respondia a todas as minhas cartas (risos).

QUEM: Sua filha é médica. O fato de ela não ter seguido sua carreira, que é instável, a deixou tranquila?
RS: Ela quis ser médica desde criança, lembro dela receitando remédio para as amigas. Mariana é pediatra e ótima médica, gosta de medicina pública, hospital público. É uma vocação mesmo. Não posso imaginar minha vida sem ela, e agora, com os meus netos... Só tive a Mariana, mas a Mariana foi boa... Que bom que a tive!

QUEM: Como você é como avó?
RS: Muito coruja, mas não estrago. Não forço o que está errado. Pode comer a bala que quiser? Não, não vou oferecer porque pode dar cárie. Mas brinco com eles, levo Miguel ao teatro. Neto é algo adorável, você se reconhece, reconhece sua filha, rejuvenesce com o neto. É muito bom, dá alegria e mais sentido para a vida. É mais uma coisa que te dá forças.

QUEM: Você já falou sobre os benefícios da terapia. Continua fazendo?
RS: Agora não, mas sempre fiz, desde os 20 anos. Mas é assim, fazia dois anos, me achava ótima, me dava alta. Passava o tempo, voltava. Atriz tem que fazer terapia, quanto mais você se conhece, mais disponível você está para os personagens.

QUEM: E do corpo, como cuida?
RS: Tenho muita energia e faço exercícios, ginástica. Ando quase todo dia uma hora em ritmo forte, no Jardim Botânico. É bonito e tem sombra, o que é legal para mim, porque não dá mais para ficar tomando sol por causa da pele.

QUEM: A sua profissão pode não ser muito generosa com as atrizes mais velhas...
RS: Se você lida bem, pode até ser generosa, porque você vai continuar trabalhando sempre. Você vai ser filha, mãe, avó, vai ser jovem, a mulher de 30 anos, a mulher madura. E, hoje, a mulher de 60 anos não é a mesma de antigamente. Espero que eu me saia bem, estou no auge do processo. Olha que maravilha ser mais velha: eu descobri um livro que tenho, de 1974, da Clarice Lispector, com uma dedicatória dela: “Renata, que você seja muito feliz na sua vida pessoal e profissional”.

QUEM: Como lida com as rugas?
RS: Estou aprendendo a ficar mais velha. Você aprende sobre a finitude, sobre a morte, a chegada dos netos, a vida que continua, é tudo isso. A ruga é um símbolo. É fácil? Não. Continua sendo um aprendizado.

QUEM: Depois de tanto tempo de carreira, o público é carinhoso com você?
RS: Muito. Não tenho queixa alguma. Mente quem diz que não gosta do aplauso. Eu te dou e você me reconhece. Adoro trabalhar, gosto quando encontro meu grupo, quando tem uma trupe. Saramandaia tem um pouquinho disso. O ator não é solitário, acho uma chatice essa coisa de diva, sozinha, se achando maravilhosa.


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