Quantcast
Channel: Revista Quem Acontece
Viewing all articles
Browse latest Browse all 971807

Jesuíta Barbosa: "A sociedade coloca a gente em algumas caixas"

$
0
0
Jesuíta Barbosa é estrela de Lazarus (Foto: Fabio Cordeiro/Ed Globo)


 

Dono de um currículo sólido, com mais de 30 peças, filmes e trabalhos na televisão, Jesuíta Barbosa sempre quis cantar em cena. E, depois de viver a Shakira do Sertão na minissérie Onde Nascem os Fortes (2018), quando teve aulas de canto e soltou a voz como a drag queen, ele realizou o sonho de fazer um musical com Lazarus, escrito por David Bowie e Enda Walsh, que, depois de um temporada em São Paulo, aterrissa no Rio, em duas curtas temporadas, de 6 a 16 de fevereiro e de 5 a 15 de março, no Teatro Multiplan, na Barra. “Não sou cantor profissional, mas fui entendendo que quando você não nasce com a voz, com o talento do canto, consegue resultado pela técnica”, brinca o ator de 28 anos, que, nas duas horas de espetáculo, divide a cena com Carla Salle e Bruna Guerin, entre outros.


 

Com direção de Felipe Hirsh, Lazarus tem 18 músicas de diversas fases da carreira de Bowie e conta a história de Thomas Newton, um alienígena que viaja para terra para salvar seu planeta. Bowie viveu o personagem no filme O Homem Que Caiu na Terra, em 1976, baseado no livro de mesmo nome de Walter Trevis. Jesuíta conta que estudar o universo de Bowie “desencareteia”.

“A gente é careta. Mesmo quem não quer (ser), a sociedade coloca a gente em algumas caixas”, garante o ator que com Lazarus está, pela primeira vez não se cobrando tanto. “A maioria dos meus trabalhos me cobro e sofro muito sem precisar. Essa peça eu fiz com mais leveza, apesar de se falar de morte. Ainda que toda a história do Bowie seja bastante densa, tinha essa transgressão e essa vontade libertária e libertina que me interessava”, diz ele, que antes da estreia paulista teve ensaios de 12 horas e aulas de canto e de expressão corporal.

Jesuíta Barbosa em ensaio para Quem (Foto: Fabio Cordeiro/Ed Globo)


 

Jesuíta conhecia algumas canções mais famosas de Bowie, como Let's Dance, mas se aprofundou no universo do cantor depois de ser aprovado para viver Thomas. “Eu me joguei; fui para o teste e falei ‘vou cantar essa música mesmo que eu não saiba e vou fazer essa peça’. E, quando eu acredito, eu consigo”, diz o ator, que não passou para o personagem que queria, mas acabou ficando com o alienígena Thomas, que vem para a Terra em busca de água, o que acabou em seu planeta.

“É um reflexo de um futuro próximo do nosso mundo. Inclusive aqui no Rio de Janeiro já começou”, pondera o ator, lembrando a atualidade do tema e a crise de abastecimento na cidade. “A falta desse bem, da água, é uma das muitas questões da peça. Thomas vem para a Terra por causa da água, mas isso se traduz como uma crise existencial. Com o passar dos anos, ele vai se humanizando, e o legal é que o verbo humanizar aqui não é usado no sentido bom que no geral a gente usa: ele se torna humano e cada vez mais decadente”, explica.

Jesuíta Barbosa interpreta Thomas Newton, um alienígena que viaja para terra para salvar seu planeta (Foto: Fabio Cordeiro/Ed Globo)


 


 

Jesuíta Barbosa em ensaio exclusivo (Foto: Fabio Cordeiro/Ed Globo)


 

A peça, montada pela primeira vez em 2015 nos Estados Unidos, é fruto de um processo de maturação de Bowie décadas após o filme. Discussões presentes desde o livro, no filme e no espetáculo, como a solidão e a inadequação, são caras ao ator. “O tempo todo me sinto assim, é algo inerente ao ser humano. Não que a gente tenha que se sentir só o tempo inteiro, assim como não há de se sofrer o tempo todo. Mas é importante aceitar quando isso acontece”, diz Jesuíta, que conta se sentir bastante sozinho em São Paulo, onde vive. “É uma cidade que te faz entender que você tem sua individualidade. Mas eu tenho muitos amigos, tá?”, brinca.

Nascido em Pernambuco e criado em Fortaleza, Jesuíta lembra que foi o teatro que o “salvou”. “Encontrei uma história de força que só me faz bem, um lugar em que posso me calar e aceitar meu processo ter meu tempo de fazer as coisas”, diz o ator, que sempre se manteve reservado quanto à vida pessoal. “Existe a exposição do trabalho, mas tento me guardar. Sempre fui tímido e eu acho que (a timidez) é uma defesa minha e me serve como forma de proteção”, explica.

Jesuíta Barbosa realiza o sonho de fazer musical (Foto: Fabio Cordeiro/Ed Globo)


 

Se, ao contrário de muitas artista, o particular é resguardado, Jesuíta fala sem problemas sobre o que acredita ser papel do ator para uma sociedade melhor. “Todo teatro é político. Todo ator é político. Eu prefiro entender que a maioria dos artistas vão por um caminho mais solidário, menos reacionário. Não quero usar o termo fascista, mas nesse governo está tudo tão difícil, tão estranho... É um mal-estar geral mesmo”, avalia sobre a gestão do Brasil.

“Eu me percebo dentro desse movimento (de mudar o mundo). É o nosso trabalho (do artista) questionar socialmente porque as coisas são como são, porque não podem melhorar”, afirma. “Hoje eu me sinto muito num lugar desconfortável politicamente, pensando em política partidária mesmo, de quem não me representa. Eu sinto ameaça à existência do artista. Existe uma ameaça à classe. Essa profissão está ameaçada, assim como um professor de cinema está ameaçado nesse governo, um jornalista”, explica.

Jesuíta diz que garantir o espaço do fazer artístico é uma prioridade para ele. “É isso que me move. A arte é fundamental e não tem como viver sem. Quando vem essa onda reacionária e diz que é menos importante, eu fico me perguntando não só enquanto artista, mas como indivíduo, qual é o meu papel se eu não conseguir encontrar esse caminho da arte, que é o respiro”, questiona, para logo dar a resposta. “Se a gente não aprende a respirar não adianta”, ensina.

Visagismo: Mima Mizukami

Serviço:
Lazarus
Teatro Multiplan – Shopping VillageMall (Avenida das Américas 3.900,  3900 - 160 - Barra da Tijuca, Rio).
Telefone: (21) 3431-0100.
Temporada: 6 a 16 de fevereiro e outra de 5 a 15 de março.
Horários: Quinta a sábado, às 21h; e domingo, às 19:30h.
Ingressos: R$ 400 a R$ 100 (meia-entrada).

Jesuíta Barbosa solta a voz em músicas de David Bowie (Foto: Fabio Cordeiro/Ed Globo)

 

 Jesuíta Barbosa sempre quis cantar em cena (Foto: Fabio Cordeiro/Ed Globo)


 


Viewing all articles
Browse latest Browse all 971807


<script src="https://jsc.adskeeper.com/r/s/rssing.com.1596347.js" async> </script>